A bitcoin é uma moeda? Não.

As três funções e requisitos de uma moeda, (i) reserva de valor, (ii) unidade de conta e (iii) moeda commumente aceite, não se verificam no caso das bitcoins. Muitos asseguram que pagam o dentista com bitcoins e que muitas empresas já aceitam pagamentos nessa moeda, mas provavelmente estamos perante estratégias de marketing. Quando esta moeda for commumente aceite – e isso talvez só acontecerá com regulação e supervisão de uma entidade (monetária ou governamental) cuja autoridade seja reconhecida por todos – então estaremos perante uma verdadeira moeda em termos económicos.

Uma visão mais disruptiva pode argumentar, e com razão, que foram as políticas monetárias expansionistas e intervencionistas dos Bancos Centrais que provocaram as crises financeiras.

Todavia, é preferível ter moeda fiduciária a uma moeda não regulada e não supervisionada.

Por maior que seja o avanço tecnológico, os governos não vão deixar de cobrar impostos! Como se pagariam exércitos, tribunais e outros bens e serviços públicos essenciais?

Quem acha que a bitcoin pode ser uma moeda comumente aceite vive numa fantasia, tal como a corrente ideológica que ficou conhecida como o “socialismo utópico”.

O dinheiro fácil, com baixas taxas de juro, impulsionou a valorização desta moeda virtual, mas não podemos dizer que se trata de uma verdadeira moeda.

Existem 1364 criptomoedas, contra as cerca de 100 moedas tradicionais, associadas aos respetivos países e bancos centrais, mas as ofertas públicas – as denominadas ICO (Initial Coin Offering) – vão-se sucedendo.

Mesmo o ouro é fiduciário, baseado na confiança de que as pessoas o aceitam, pela sua raridade e impossibilidade de contrafação. Mas um litro de água no deserto pode valer muito mais do que um Kg de ouro. As obras de arte também são fiduciárias, embora exista aqui muita subjetividade.

Quando a economia se baseava no sistema de escambo, com a troca direta entre bens e serviços, a divisão do trabalho era quase impossível. Com a invenção da moeda deu-se um enorme salto económico. A moeda serve para facilitar a transação de “trabalho com utilidade” e, para isso, é preciso que seja comumente aceite. A bitcoin não é.

Gastam-se milhões, em energia e processadores cada vez mais avançados, para minerar a bitcoin, como há 150 anos picaretas para minerar ouro, que tem que continuar a valorizar para compensar os custos crescentes, caso contrário sobrarão apenas tostões…

Várias casas de câmbio de criptomoedas têm falido. A Youbit, depois de ter sido vítima de roubo de 4 mil bitcoins em abril, não resistiu há três dias a mais um assalto e encerrou.

A tecnologia blockchain, usada pela bitcoin, permite registos de transações assinadas digitalmente de forma a garantir a sua autenticidade. A bitcoin funciona na base de um ledger público, com todas as transações registadas (logs) como se de um caderno de um “Guarda-Livros” se tratasse, sem rasuras, nem aditamentos.

É esta base pública, que todos podem conhecer, tal como um número de uma conta bancária que o cliente pode facultar a terceiros para fazerem uma transferência. As transações propriamente ditas são anónimas, encriptadas, e ninguém consegue aceder à nossa criptoconta sem uma password, tal como não conseguimos levantar dinheiro ou efetuar pagamentos com a nossa conta tradicional num banco sem mostrarmos um documento junto do balcão, sem um código de multibanco, ou uma password de acesso ao homebanking.

Ou seja, parece uma moeda. Mas não é. Para já é uma moda que não sabemos como vai terminar.

Paulo Rosa, In “Vida Económica”, 22 de dezembro de 2017